quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Iniciação cristã e Eucaristia


Batismo, Crisma e Eucaristia são os sacramentos que “fazem o cristão”. Naturalmente, ao longo da vida ele deve “crescer” por meio da Palavra de Deus, da conversão contínua, da oração, dos demais sacramentos, da prática do Evangelho, da participação na vida da Igreja, em particular, do constante esforço para se abrir ao amor fraterno, à solidariedade especialmente para com os mais necessitados. Enfim, a “iniciação cristã” é somente o “início”; trata-se, porém, de um início tão significativo quanto o do nascimento: nascemos para a vida humana; precisamos também nascer para a vida divina: e aqui se insere a função dos três sacramentos acima citados.
Qual você acha que é o papel da Eucaristia na iniciação cristã? Não é o caso de retomar aqui toda a doutrina sobre a Eucaristia. Só vou pôr em relevo alguns aspectos que são fundamentais para que você, feito cristão pelo Batismo e pela Crisma, encontre na Eucaristia como que o“ambiente perfeito” no qual irá viver e desenvolver sua vida divina.
Antes de tudo é bom recordar que Eucaristia não é só “comunhão eucarística”, nem só “adoração ao Santíssimo Sacramento”. É bom lembrar também que tanto o Batismo quanto a Crisma inserem você na “comunhão eclesial”, isto é, na comunidade dos que aderem a Jesus, a Igreja. Sem Igreja não há Eucaristia, como sem Eucaristia não há Igreja; portanto, sem Igreja também não tem sentido pretender ser cristão; de fato, não existe um cristianismo “individual” (para não dizer “individualista”).
Aquele que “foi feito cristão” pelo Batismo e pela Crisma, se quiser desenvolver em si a vida divina, deve começar por participar da celebração eucarística, particularmente no Dia do Senhor (o Domingo), a fim de unir-se a todos os membros da comunidade eclesial e, com eles, adorar, louvar, agradecer ao Pai pelo dom da “filiação divina” e por todos os dons e benefícios que Ele, em seu amor, concedeu a você, aos outros membros da comunidade, à Igreja inteira, à humanidade toda e ao mundo.
A Eucaristia, em primeiro lugar é, de fato, a mais perfeita “ação de graças” ao Pai, a mais perfeita oração, presidida pelo próprio Jesus, a mais perfeita comunhão com o Pai, com Jesus e com os membros da comunidade que o Espírito Santo cria e anima. Como lhe disse acima, participar da Eucaristia é mergulhar no mais adequado “ambiente” que faz com que você possa desenvolver os dons que recebeu no Batismo e na Crisma. É na hora em que esse “ambiente” é criado pela celebração eucarística que você reforça sua Fé, Esperança e Caridade; revê sua vida para um sincero esforço de conversão; assume compromissos de maior vivência do Evangelho; enfim, a Eucaristia é o “ambiente” ideal para você se tornar sempre mais cristão. Participar assim da Eucaristia é uma primeira forma de “comunhão”: comungar com os irmãos e irmãs, reunidos em torno de Jesus, animados pela presença do Espírito, para ir ao encontro do Pai de todos os dons. Diria que esta é a dimensão “eclesial” da Eucaristia.
A Eucaristia é também o sacrifício de Jesus sob os sinais de pão e de vinho, sacrifício que Ele, em seu amor ao Pai e por nós, consumou no Calvário, movido pelo Espírito Santo, que o levou a fazer o maior ato de amor que jamais se viu brotar de um coração humano. Ora, toda vez que se celebra a Eucaristia torna-se presente aqui e agora o sacrifício de Jesus. Você, participando da celebração eucarística, junto com os demais participantes, é como que “arrastado” pelo ato de amor de Jesus a se oferecer ao Pai junto com Ele, em gesto de obediência, de arrependimento, de conversão, de salvação do mundo inteiro. Você não é um assistente mudo do sacrifício; você de fato participa dele, torna-o seu, envolve nele toda a sua vida, todos os seus pecados, todo o seu amor arrependido, todas as suas dores, seus fracassos, mas também todos os seus esforços para viver amorosamente à imitação do amor de Jesus pelo Pai e por nós.
E quem está “por trás” de todo esse movimento que, da terra, por Jesus, com Jesus e em Jesus, se eleva ao Pai? O Espírito Santo. Por isso, participar da Eucaristia é também “comungar” com o sacrifício de Jesus, em obediência ao Pai, animado pelo Espírito, para a salvação de todos. Como você pode observar, também aqui, nada de individualismo: tudo é “comunhão”. Esse é o momento em que seu Batismo e sua Crisma adquirem sentido mais profundo: filho/a de Deus, animado pelo Espírito Santo, você se deixa pregar na cruz junto com Jesus. Sua identificação com Ele se aproxima do seu ponto alto.
Por fim, chega a hora da comunhão eucarística. Participar da carne e do sangue de quem foi imolado em sacrifício é um gesto de identificação com a vítima, Jesus: Ele em você, você nele! Não pode haver comunhão maior. Unido a Jesus pela comunhão eucarística, você se torna uma coisa só com Ele; unido a Ele, você mergulha na comunhão que existe entre Ele e o Pai no amor do Espírito Santo. De verdade, recebendo Jesus eucarístico, na prática, você “recebe” também o Pai e o Espírito Santo, pois os três são inseparáveis. Se o Batismo gerou você como filho/a, se a Crisma tornou você templo do Espírito Santo, ao comungar a Eucaristia, Jesus o “arrasta” para dentro da comunhão trinitária, onde se dá a perfeita unidade, a plena salvação, a eterna felicidade. Deve-se dizer que a comunhão eucarística é a realidade presente e a antecipação sob sinais da eterna “comunhão” com Deus, e nisto consiste a salvação.
Como você percebe, a Eucaristia é de fato o “ambiente” em que o Batismo e a Crisma encontram sua maior profundidade e expansão. A Eucaristia é o acontecimento em que você, em Jesus e por Jesus, se transforma sempre mais em filho/a de Deus e se deixa conduzir pelo Espírito Santo a crescer como “pequeno deus”. Não você sozinho, mas com toda a comunidade que celebra a Eucaristia. Daí é que deriva o compromisso próprio da Eucaristia: quem participa das três “comunhões” de que há pouco falamos deve também entrar em comunhão com todos os membros da Igreja (esta é uma quarta “comunhão”) e com toda a humanidade. Se não há comunhão eclesial sem Eucaristia, também não pode haver Eucaristia autêntica sem comunhão na caridade, sem compromisso de amor fraterno e de solidariedade. É assim que o Batismo, a Crisma e Eucaristia, sacramentos da iniciação cristã, fazem o verdadeiro discípulo/a de Jesus.
Dom Hilário Moser, SDB, é bispo emérito da Diocese de Tubarão (SC)