quarta-feira, 29 de junho de 2011

Deus existe? - As cinco vias de São Tomas de Aquino

• Pode-se provar a existência de Deus por cinco vias:

parte do movimento.
A) Tudo o que se move é movido por outro.
• Nada se move que não esteja em potência em relação ao termo de seu movimento.
• Ao contrário, o que move o faz enquanto se encontra em ato.
• Portanto, mover nada mais é do que levar algo da potência ao ato, e nada pode ser levado ao ato senão por umente em ato.
  • Exemplo: O fogo (quente em ato) torna a madeira, que está em potência para o calor, quente em ato, e assim a move e altera.
• Ora, não é possível que a mesma coisa, considerada sob o mesmo aspecto, esteja simultaneamente  em ato e em potência.
  • Exemplo: o que está quente em ato não pode estar simultaneamente quente em potência, mas está frio em potência.
• É impossível que sob o mesmo aspecto e do mesmo modo algo seja motor e movido, ou que mova a si próprio. É preciso que tudo o que se move seja movido por outro.
B)
• Assim, se o que move é também movido, o é necessariamente por outro, e este por outro ainda.
• Ora, não se pode continuar até o infinito, pois neste caso não haveria um primeiro motor, por conseguinte, também outros motores, pois os motores segundos só se movem pela moção do primeiro motor.
• Então, é necessário chegar a um primeiro motor, não movido por nenhum outro, e este é Deus.
2) parte da razão de causa eficiente.
  • Nas realidades sensíveis encontramos a existência de uma ordem entre as causas eficientes, mas não encontramos algo que seja causa eficiente de si próprio, pois desse modo teria de ser anterior a si próprio, o que é impossível.
  • Tampouco é possível, entre as causas eficientes ordenadas, continuar até o infinito, pois:
  • Entre todas as causas eficientes ordenadas, a primeira é a causa das intermediárias, e estas a causa da última.
  • Supressa a causa, suprime-se também o efeito. Portanto, sem a causa primeira não haveria a intermediária e nem a última.
  • Ora, numa seqüência infinita, não haveria causa primeira, e, portanto, não haveria efeito último e nem causaintermediária.
• Logo, é necessário afirmar uma causa eficiente primeira, o que é chamado de Deus.
é tomada do possível e do necessário.
• Encontramos, entre as coisas, as que podem ser ou não ser, uma vez que algumas nascem (pela geração, elassão) e perecem (pela corrupção, deixam de ser, não são mais).
• Mas é impossível ser para sempre o que é de tal natureza: o que pode não ser, não é em algum momento (o que é eterno não pode não ser). Ou seja, o que pode não-ser necessariamente deve ter sido gerado, e aquilo que foi gerado, começou a partir do não-ser.
• Se é verdade que tudo pode não ser, pode ter havido um momento em que nada havia, mas então nada hoje existiria, pois o que não é só passa a ser por intermédio de algo que já é. É necessário, pois, que sempre algoseja.
• Assim, nem todos os entes são possíveis, mas é preciso que algo seja necessário entre as coisas, e tudo o que é necessário tem, ou não, a causa de sua necessidade de um outro.
• Aqui também não é possível continuar até o infinito na série das coisas necessárias que tem uma causa da própria necessidade, como acontece entre as causas eficientes (2ª via).
• Portanto, é necessário afirmar a existência de algo necessário por si mesmo, que não encontra em outro lugar a causa  de sua necessidade, mas que é causa da necessidade para os outros: o que chamamos Deus.
4) se toma dos graus que se encontram nas coisas.
• Encontra-se nas coisas algo mais ou menos bom, mais ou menos verdadeiro, mais ou menos nobre, etc.
• Ora, mais e menos se dizem de coisas diversas conforme elas se aproximam diferentemente daquilo que é em si o máximo. Existe, pois, em grau supremo algo verdadeiro, bom, nobre e, conseqüentemente, o ente em grau supremo (como se mostra no livro II da Metafísica, o que é em sumo grau verdadeiro, é ente em sumo grau). Assim, mais quente é o que mais se aproxima do que é sumamente quente.
• Por outro lado, o que se encontra no mais alto grau em determinado gênero é causa de tudo que é desse gênero(idem: Metafísica, livro II): assim o fogo, que é quente, no mais alto grau, é causa do calor de todo e qualquer corpo aquecido.
• Existe então algo que é, para todos os outros entescausa de ser, de bondade e de toda a perfeição: nós o chamamos Deus.
Nota:   O exemplo do fogo nos deixa embaraçados. Deve-se ver nele uma ilustração, muito eficaz para os contemporâneos de Sto. Tomás, que viam no fogo um corpo no qual se realizava o calor absoluto, mas inoperante para nós. Contudo, não se trata de um argumento cuja evidente não-pertinência invalide toda a argumentação. De maneira tão condensada que o seu procedimento permanece obscuro, tal raciocínio evoca o grande tema metafísico da participação, que não provém de Aristóteles, mas de Platão, e que, profundamente remodelado pela introdução da causalidade eficiente e da limitação do ato pela potência – estas sim provenientes de Aristóteles -, está no centro da metafísica de Sto. Tomás. O calor é uma qualidade material, cujo grau de intensidade provém da quantidade: e sabemos muito bem que a série dos números pode prolongar-se indefinidamente sem que encontremos um número que seja o primeiro. Uma qualidade espiritual não resolveria o problema, pois o mais ou o menos, o grau de intensidade, não podem ser tomados em relação a um primeiro no qual essa qualidade seria ilimitada, toda qualidade estando limitada em sua perfeição ontológica devido ao fato de ela ser um acidente. Mas, os valores que a demonstração leva em consideração são atributos da própria essência dos seres, assim como de seus acidentes. Ora, a própria essência exclui o mais ou o menos. É preciso portanto, se ela for mais ou menos verdadeira, boa, bela… que seja por comparação com uma essência que seja a verdade, a bondade, a beleza… e tudo isso ao infinito e absolutamente. Todos esses valores, que são recebidos nos entes que conhecemos, e devido a isso limitados, só podem derivar, por causalidade, daquele do qual constituem aessência. Os entes nos quais os encontramos parcialmente realizados participam de tais valores e participamdaquele no qual elas se realizam plenamente, ou seja, infinitamente.
5) se toma do governo das coisas.
• Algumas coisas que carecem de conhecimento, como os corpos físicos, agem em vista de um fim, visto que sempre, ou na maioria das vezes, agem da mesma maneira, a fim de alcançarem o que é ótimo.
• Fica claro que não é por acaso, mas em virtude de uma intenção, que alcançam o fim.
• Ora, como pode algo que não tem conhecimento tender a um fim, a não ser dirigido por algo que conhece e que é inteligente?
• Logo, existe algo inteligente pelo qual todas as coisas naturais são ordenadas, e que nós chamamos Deus.
:

Deus existe?

QUANTO AO TERCEIRO, ASSIM SE PROCEDE – Parece que Deus não existe.
1. Pois, um dos contrários, sendo infinito, destrói o outro totalmente. E como, pelo nome de Deus, se entende um bem infinito, se existisse Deus, o mal não existiria. O mal, porém, existe no mundo. Logo, Deus não existe.
2. Ademais – O que se pode fazer com menos não se deve fazer com mais. Ora, tudo o que no mundo aparece pode ser feito por outros princípios, suposto que Deus não exista; pois, o natural se reduz ao princípio, que é anatureza; e o proposital, à razão humana ou à vontade. Logo, nenhuma necessidade há de se supor a existência de Deus.
EM SENTIDO CONTRÁRIO, diz a Escritura (Ex. 3, 14), da pessoa de Deus: Eu sou quem sou.
RESPONDO. – Por cinco vias pode-se provar a existência de Deus:
A primeira e mais manifesta é a procedente do movimento; pois, é certo e verificado pelos sentidos, que alguns seres são movidos neste mundo. Ora, todo o movido por outro o é. Porque nada é movido senão enquantopotencial, relativamente àquilo a que é movido, e um ser move enquanto em ato. Pois mover não é senão levar alguma coisa da potência ao ato; assim, o cálido atual, como o fogo, torna a madeira, cálido potencial, em cálido atual e dessa maneira, a move e altera. Ora, não é possível uma coisa estar em ato e potência, no mesmo ponto de vista, mas só em pontos de vista diversos; pois, o cálido atual não pode ser simultaneamente cálido potencial, mas, é frio em potência. Logo, é impossível uma coisa ser motora e movida ou mover-se a si própria, no mesmo ponto de vista e do mesmo modo, pois, tudo o que é movido há de sê-lo por outro. Se, portanto, o motor também se move, é necessário seja movido por outro, e este por outro. Ora, não se pode assim proceder até ao infinito, porque não haveria nenhum primeiro motor e, por conseqüência, outro qualquer; pois, os motores segundos não movem, senão movidos pelo primeiro, como não move o báculo sem ser movido pela mão. Logo, é necessário chegar a um primeiro motor, de nenhum outro movido, ao qual todos dão o nome de Deus.
A segunda via procede da natureza da causa eficiente. Pois, descobrimos que há certa ordem das causas eficientes nos seres sensíveis; porém, não concebemos, nem é possível que uma coisa seja causa eficiente de si própria, pois seria anterior a si mesma; o que não pode ser. Mas, é impossível, nas causas eficientes, proceder-se até o infinito; pois, em todas as causas eficientes ordenadas, a primeira é causa da média e esta, da última, sejam as médias muitas ou uma só; e como, removida a causa, removido fica o efeito, se nas causas eficientes não houver primeira, não haverá média nem última. Procedendo-se ao infinito, não haverá primeira causa eficiente, nem efeito último, nem causas eficientes médias, o que evidentemente é falso. Logo, é necessárioadmitir uma causa eficiente primeira, à qual todos dão o nome de Deus.
A terceira via, procedente do possível e do necessário, é a seguinte – Vemos que certas coisas podem ser e não ser, podendo ser geradas e corrompidas. Ora, impossível é existirem sempre todos os seres de tal natureza, pois o que pode não ser, algum tempo não foi. Se, portanto, todas as coisas podem não ser, algum tempo nenhuma existia. Mas, se tal fosse verdade, ainda agora nada existiria pois, o que não é só pode começar a existir por uma coisa já existente; ora, nenhum ente existindo, é impossível que algum comece a existir, e portanto, nada existiria, o que, evidentemente, é falso. Logo, nem todos os seres são possíveis, mas é forçoso que algum dentre eles seja necessário. Ora, tudo o que é necessário ou tem de fora a causa de sua necessidade ou não a tem. Mas não é possível proceder ao infinito, nos seres necessários, que têm a causa da própria necessidade, como também o não é nas causas eficientes, como já se provou. Por onde, é forçoso admitir um ser por si necessário, não tendo de fora a causa da sua necessidade, antes, sendo a causa da necessidade dos outros; e a tal ser, todos chamam Deus.
A quarta via procede dos graus que se encontram nas coisas. – Assim, nelas se encontram em proporção maior e menor o bem, a verdade, a nobreza e outros atributos semelhantes. Ora, o mais e o menos se dizem de diversos atributos enquanto se aproximam de um máximo, diversamente; assim, o mais cálido é o que mais se aproxima do maximamente cálido. Há, portanto, algo sumamente verdadeiro, ótimo e nobilíssimo e, por conseqüente, maximamente ser; pois, as coisas maximamente verdadeiras são maximamente seres, como diz o Filósofo. Ora, o que é maximamente tal, em um gênero, é causa de tudo o que esse gênero compreende; assim o fogo, maximamente cálido, é causa de todos os cálidos, como no mesmo lugar se diz. Logo, há um ser, causa do ser, e da bondade, e de qualquer perfeição em tudo quanto existe, e chama-se Deus.
A quinta procede do governo das coisas – Pois, vemos que algumas, como os corpos naturais, que carecem de conhecimento, operam em vista de um fim; o que se conclui de operarem sempre ou freqüentemente do mesmomodo, para conseguirem o que é ótimo; donde resulta que chegam ao fim, não pelo acaso, mas pela intenção. Mas, os seres sem conhecimento não tendem ao fim sem serem dirigidos por um ente conhecedor e inteligente, como a seta, pelo arqueiro. Logo, há um ser inteligente, pelo qual todas as coisas naturais se ordenam ao fim, e a que chamamos Deus.
QUANTO AO 1º. – Como diz Agostinho, Deus sumamente bom, de nenhum modo permitiria existir algum mal nas suas obras, se não fosse onipotente e bom para, mesmo do mal, tirar o bem. Logo, pertence à infinita bondade de Deus permitir o mal para deste fazer jorrar o bem.
QUANTO AO 2º. – A natureza, operando para um fim determinado, sob a direção de um agente superior, énecessário que as coisas feitas por ela ainda se reduzam a Deus, como à causa primeira. E, semelhantemente, as coisas propositadamente feitas devem-se reduzir a alguma causa mais alta, que não a razão e a vontade humanas, mutáveis e defectíveis; é, logo, necessário que todas as coisas móveis e suscetíveis de defeito se reduzam a algum primeiro princípio imóvel e por si necessário, como se demonstrou.